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A normalização de operações policiais em favelas

Chegamos ao último dia do mês de maio com o registro, até agora, de 13 operações policiais, somente este ano, em algumas das 16 favelas da Maré. Identificamos, também, neste dia, ações policiais em pelo menos mais cinco favelas do Rio de Janeiro.

Após três anos de redução no número de operações policiais, abrangendo o conjunto de favelas da  Maré, voltamos a identificar um aumento significativo de intervenções policiais este ano, especialmente no último trimestre. A diminuição no número de operações ocorreu em função, especialmente, de processos de mobilização comunitária e participação social com protagonismo de moradores e organizações da sociedade civil em ações judiciais, como a “ADPF das Favelas” e a Ação Civil Pública (ACP) da Maré.

Temos refletido sobre as razões da volta de crescimento de operações policiais na região das 16 favelas da Maré e, ainda, sobre as suas motivações para o enfrentamento do que os gestores da segurança pública no Estado do Rio de Janeiro apontam querer combater. O nosso ponto diz respeito à forma e às possíveis justificativas legais para essas incursões acontecerem do modo que são feitas. O entendimento que temos é que essas não deveriam ser normalizadas, como estratégia única na rotina da segurança pública, quando se trata de regiões de favelas e periferias.

Como consta na lei, operações policiais deveriam ser o último recurso a ser utilizado como estratégia de trabalho na atividade policial. Deveriam  seguir, ainda, por exemplo, as premissas que constam na Instrução Normativa da Secretaria de Estado de Segurança (SESEG), que estabelece diretrizes para o aprimoramento dos atos normativos das polícias civil e militar. As instituições policiais deveriam fortalecer processos investigativos e de prevenção aos crimes e não centrar sua atividade, majoritariamente, em ações pontuais e repressivas que não ampliam e nem fortalecem direitos da população carioca, em especial, daquelas que vivem em favelas e periferias.

A narrativa das autoridades policiais, neste momento, foca na repressão ao roubo e furto de cargas como motivação de grande parte dessas operações. Cabe destacar que este tipo de crime, assim como tantos outros, não tem sua origem em territórios de favelas e periferias. Existem diversos estruturantes na cidade que são vertentes e bases desses crimes. Nos questionamos por que são os territórios de favelas e periferias os alvos principais deste tipo de ação tão violenta?

Reforçamos a necessidade de se rever, por parte dos órgãos de segurança pública, essa única e letal maneira de lidar com atividades ilícitas e criminosas quando se trata de favelas. Há que se pensar como o estado pode se responsabilizar sobre os efeitos das recorrentes paralisações de escolas, clínicas de saúde, comércios, dentre outros serviços, numa região como as favelas da Maré onde residem em torno de 140 mil pessoas.   

No combate ao crime, deveria se pensar na garantia de direitos de toda população da cidade, independente do local de moradia. Para tal, investir em outras formas de ação que não as militarizadas é fundamental. A vida das pessoas desses territórios não podem ser ignoradas e desvalorizadas. Isso é tão criminoso quanto o que o Estado diz querer enfrentar. 

A atual política de segurança pública do Rio de Janeiro precisa ser questionada de forma definitiva. É papel do Estado contribuir para a diminuição  da insegurança que causa à população favelada e periférica, como também adotar medidas eficazes para promover a segurança física e patrimonial de todas e todos.

Em mais uma operação policial em algumas favelas da Maré, não podemos deixar de chamar atenção, 23 unidades escolares não puderam funcionar, afetando 7.722 alunos. As atividades na Clínica da Família Jeremias Moraes da Silva e Diniz Batista dos Santos foram suspensas, pela terceira vez atendimentos do Núcleo de direitos da Mulher vinculado à Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro não puderam ser realizados, além de outras atividades em espaços públicos, como espetáculos e oficinas programados para hoje na Lona Cultural Municipal Herbert Vianna. 

Para além do impacto em serviços básicos e no cotidiano das pessoas que moram, trabalham, estudam ou circulam nas favelas da Maré, na operação de hoje, ocorreram danos ao patrimônio, invasões de domicílios, agressões físicas e subtração de pertences. A retirada de barricadas em algumas áreas não poderia acontecer com o estouro de cano, deixando moradores sem acesso ao abastecimento de água em um número significativo de casas. Agentes policiais também não poderiam atear fogo em objetos e provocar incêndio em áreas com tanta densidade de casas.

Isso não pode ser NORMAL!

 

Redes da Maré

Rio de Janeiro, 31 de maio de 2023

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