voltar
Maré Sem Fome: Segurança Alimentar como direito

Julia Bruce

Cerca de 15 a 20 tecedores, prestadores de serviços e até ex-tecedores estão trabalhando diariamente no Galpão de Segurança Alimentar, na Baixa do Sapateiro, realizando a entrega de cestas básicas para cerca de 6 mil famílias a partir da campanha Maré Sem Fome entre as semanas do Natal e Ano Novo em todo o Conjunto das 16 Favelas da Maré. A campanha é viabilizada pela frente de Segurança Alimentar, do eixo Direito à Saúde da Redes da Maré, por meio de arrecadação financeira desde o final de novembro.

“Desde que as questões da pandemia ‘melhoraram’, recebemos menos doações, já que começamos esse trabalho de entrega na época da campanha Maré diz NÃO ao coronavírus, porque antes não havia essa frente de trabalho da segurança alimentar. Mas sabemos que ainda tem muitas famílias em vulnerabilidade e se encontram em situação de insegurança alimentar grave ou gravíssima e resolvemos fazer a campanha Maré sem Fome para tentar atender o máximo possível”, explica a coordenadora da frente de Segurança Alimentar e da atual iniciativa, Patrícia Ramalho.

A partir disso, a Redes da Maré somou esforços e promoveu a campanha Maré Sem Fome. A diretora da Redes da Maré, Eliana Sousa Silva, e a coordenadora do eixo Direito à Saúde, Luna Arouca, juntaram as equipes de diversos eixos para construir a campanha Maré Sem Fome, além de acompanharem e darem informações sobre o que precisavam. “Passamos o ano todo mobilizados, buscando recursos e entregando cestas básicas para as famílias em situação de insegurança alimentar. Infelizmente, não foi possível apoiar todas. Neste fim de ano, mobilizamos parceiros e indivíduos para garantir cestas básicas e chegar ao máximo de pessoas possíveis e assim tentar garantir um final de ano com mais proteção para estas famílias”, comenta Luna.

 

 

Desde agosto de 2021, a equipe social da Redes da Maré vêm mantendo em atualização a situação das famílias no banco de dados criado na época da pandemia, fazendo visitas domiciliares e entrevistas sociais. Foram identificadas mais de 6 mil famílias em insegurança alimentar e que já passaram por algum projeto da Redes da Maré, como o Impacto de Vidas ou cursos do eixo Educação.

“Durante o primeiro ano de pandemia, havia um atendimento presencial no Centro de Artes da Maré, onde as pessoas nos procuravam para falar sobre suas demandas, então haviam aquelas mais urgentes, em que liberávamos uma cesta avulsa, em outras, íamos na casa da família para traçar o perfil e verificar se ela continuaria a receber cesta básica. Agora, continuamos fazendo essa atualização quando entregamos a cesta na campanha Maré Sem Fome. Vemos quem realmente está precisando e quem já está trabalhando e não precisa mais da nossa ajuda”, conta a assistente social Kátia Bezerra, nascida e criada na Maré, ex-aluna do Curso Pré-Vestibular e estagiária do projeto Nenhum a Menos. Há um ano e meio ela voltou para a Redes da Maré e hoje atua no eixo Direito à Saúde e entregando as cestas básicas às famílias. Em 2021, a partir desse acompanhamento, mais de 2.400 famílias receberam cesta básica.

Até a terceira semana de dezembro, a equipe adquiriu cestas básicas que começaram a ser entregues nas favelas Conjunto Bento Ribeiro Dantas, Vila dos Pinheiros, Morro do Timbau e Baixa do Sapateiro. Na última semana, a entrega começou pela Rubens Vaz. Uma das moradoras que recebeu a cesta é Nauara Pereira, nascida e criada na Baixa do Sapateiro, mãe solteira com dois filhos (8 e 13 anos). Ela trabalhava com bronzeamento artificial e, para somar à renda, costumava fazer biquínis de fita, mas um de seus filhos é cardiopata e por conta do tratamento, precisou cuidar dele. “Eu estou à procura de um emprego e sempre participo dessas ações sociais, já fiz curso de espanhol na Redes da Maré e ainda tenho vontade de fazer aula de violão. A Redes é fundamental para a comunidade, é fundamental para tudo!”.

Sua família também já foi assistida pela campanha Maré diz NÃO ao coronavírus com cestas básicas de alimentos e kits de higiene, como álcool em gel e máscaras. Desde aquela época, ela é acompanhada pela equipe social e recebe visitas domiciliares das assistentes sociais. “Por mais que o nome seja cesta básica, ela acaba não sendo básica para muitas famílias. Ela me ajuda muito! O grosso já tá bem caro”, conta emocionada ao receber a cesta pela campanha Maré Sem Fome. Outra moradora, Mônica de Lima, seu marido e seis filhos também vêm recebendo cestas básicas desde a primeira campanha: “Só de saber que você tem alimento dentro de casa, é a melhor coisa!”.

 

 

Logística da campanha

De 8 às 17 horas, de segunda a sexta, a equipe de apoio vem recebendo e organizando as cestas no Galpão de Segurança Alimentar e colocando nos carros. No momento, são cinco motoristas - a maioria mareense. Tecedores que têm carros também participam da entrega, além de outros eixos e setores da Redes da Maré, como eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça e o Arte, Cultura, Memórias e Identidades que estão contribuindo com a distribuição das cestas.

Carlos Miranda é tecedor da organização há 12 anos, ajudou a reformar o Centro de Artes da Maré em 2010 e vem colaborando na área da manutenção dos equipamentos e logística das cestas básicas desde a campanha Maré diz NÃO ao coronavírus. “O retorno dos moradores é gratificante. Trabalhamos muito. Às vezes, chego às 4h30 para abrir o Galpão e saio às 22 horas. Há muitas pessoas que não conhecem de verdade a comunidade, como eu mesmo, que não conhecia quando cheguei na Maré há 31 anos. Não tinha noção do que era essa comunidade, tem pessoas com muitas coisas e outras que não têm realmente nada”, afirma o tecedor.

Aluno da primeira turma do Curso Preparatório Para o Ensino Médio da Redes da Maré, Daniel Rocha, é prestador de serviço e está ajudando pela primeira vez em uma ação como essa. Daniel nasceu e cresceu na Nova Holanda e também dialoga com a percepção do Carlos. “A gente mora dentro da favela, mas quando fazemos uma ação assim, conseguimos ver de verdade como é a situação de outras pessoas que são bem abaixo da expectativa que o povo espera que seja morador de favela. Vem morador chorando e abraçando a gente. Isso dá ânimo para continuar trabalhando!”.

 

 

Patrícia Ramalho comenta que é sua primeira campanha desde que chegou à gestão da frente de Segurança Alimentar. “É muito significativo, é um momento de esforço, de trabalho pesado, mas que ao mesmo tempo, a gente sabe que está conseguindo atender as famílias, fazer com que elas tenham um final de ano justo. São coisas tão básicas que, às vezes, não passam pela nossa cabeça. A campanha Maré Sem Fome é importante por isso e para as pessoas saberem o que acontece, que outros acessos precisam chegar. O direito à alimentação é só um, mas ainda temos muita coisa pra melhorar aqui na Maré.”

A ação tem previsão de permanecer até o Ano Novo, mas dependendo da arrecadação, as entregas poderão continuar em janeiro.

 

Informações para doação:

Doações presenciais de mantimentos ou produtos de higiene e limpeza podem ser entregues no Galpão de Segurança Alimentar da Maré: Rua Guilherme Frota, 232 - Baixa do Sapateiro (entre a Passarela 7 e 8).

Doações de qualquer valor podem ser feitas pelo site: www.redesdamare.org.br/doe

Chave PIX: doar@redesdamare.org.br

Tudo o que for arrecadado será convertido para a compra e montagem das cestas.

Fique por dentro das ações da Redes da Maré! Assine nossa newsletter!