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Nota da Redes da Maré sobre a manutenção do calendário do ENEM 2020

Em março, o aumento de casos de coronavírus no Brasil, em especial no Rio de janeiro e em São Paulo, exigiu medidas de distanciamento social para conter o processo de circulação e contaminação pelo vírus. As instituições de ensino foram as primeiras a aderir à suspensão das atividades como estratégia de combater a Covid-19. Com as aulas presenciais suspensas, diversos estudantes tiveram seu processo de aprendizagem interrompido. E tudo indica que as instituições educacionais serão as últimas a saírem da quarentena.   

Escolas privadas iniciaram o método de ensino remoto como alternativa para seguir com o cronograma escolar. Não tardou para a que proposta chegasse aos professores e estudantes da rede pública de ensino, sem considerar as particularidades dos estudantes que fazem parte das escolas públicas. O acesso a instrumentos tecnológicos não é uma realidade de todos os brasileiros, principalmente dos que residem em periferias, favelas e zonas rurais.

A população periférica sempre esteve muito distante dos privilégios da classe média. Hoje a questão tem sido pauta recorrente porque a pandemia pôs lupa nas necessidades básicas desse grupo. A população mais pobre precisa conciliar os estudos com o trabalho desde sempre para conseguir viver com o mínimo de dignidade. 

Durante a quarentena não tem sido diferente, a classe trabalhadora continua nos seus postos de trabalho e aqueles que ousam tentar buscar, por meio do ensino superior, novas oportunidades de emprego, precisam lidar com uma rotina de trabalho exaustiva. Nesse período de pandemia, além da necessidade de cumprir com a carga horária do trabalho e as atividades domésticas e familiares, precisam administrar as questões psicológicas geradas pelos medo e instabilidade do momento e sem auxílio psicológico, pois o cuidado com a saúde mental também está distante da realidade dessa população.

Em contrapartida, os estudantes da classe média seguem protegidos em suas casas, utilizando do tempo em isolamento social para se dedicar aos estudos, com o auxílio de meios tecnológicos e de cursinho pré-vestibular online. Sendo assim, fica evidente que uma vez mantido, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2020 será muito mais excludente. 

A manutenção de atividades escolares, em substituição às aulas presenciais, via plataformas digitais, acentuam ainda mais as desigualdades sociais, já que estudantes de classes populares têm um menos possibilidades de acesso a equipamentos de informática e internet. No entanto, tal situação parece não preocupar o atual Ministro de Educação, Abraham Weintraub, que decidiu manter o calendário do ENEM, contrariando a determinação da Justiça Federal de São Paulo de adiamento do ENEM, em decorrência da pandemia. O posicionamento de Weintraub aprofundará as desigualdades no acesso às universidades, atingindo principalmente os estudantes de escola pública, pertencentes à classe popular, que historicamente têm o espaço acadêmico negado.  As alegações do ministro são vazias de análise da sociedade brasileira e nega o acesso ao direito ao ensino superior aos mais pobres. 

O Censo Populacional da Maré (LEIA AQUI) revelou que apenas 36,7% dos domicílios do Conjunto de favelas da Maré têm acesso à internet e 42,4% possuem computador. Esses dados reforçam os argumentos para o adiamento do ENEM, tendo em vista que a suspensão das aulas presenciais e as estratégias de ensino à distância, via plataforma online, não atendem a todos os estudantes, restringindo o acesso à universidade a pessoas que têm meios tecnológicos de estudo e condições ideais para utilizá-los. 

Nesse sentido, a Redes da Maré se posiciona contrária à manutenção do calendário do ENEM 2020, considerando que a mesma seria, no mínimo, desrespeitosa com estudantes de população de favelas e periferias. Além de tratar-se uma clara estratégia de manutenção de privilégio e hegemonia dos mais favorecidos economicamente. 

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2020.

Redes da Maré.

 

 

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