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MC.Metaverso amplia consciência sobre a tecnologia como política de acesso

Julia Bruce

“Eu já conhecia um pouco sobre o metaverso. Sabia que era um espaço virtual que as pessoas podiam interagir, explorar... Mas eu fiquei impressionada depois de participar de algumas atividades que o metaverso é bem mais diversificado do que eu pensei que fosse, desde salas de exposições virtuais, onde artistas podem exibir suas obras, até salas de conferência, onde as pessoas podem se reunir para discutir tópicos e tudo mais”, conta a estudante Rayane Gomes, 23, que atualmente faz parte do Curso de Back-End do projeto Nas Ondas da Maré e do curso preparatório para a escola de programação 42-Rio. Ela participou dos três dias da Mostra MC.Metaverso Brasil - Territórios Brasileiros, realizada no Centro de Artes da Maré entre os dias 22 e 24 de junho, que reuniu crianças, estudantes de escola municipais da Maré, jovens de organizações locais, profissionais, interessados na área de tecnologia, entre outros públicos.

 

Foto: Douglas Lopes

 

 

Com sua primeira edição realizada pelo Movimento Cidade (Espírito Santo), Ministério da Cultura do Brasil e pela produtora ES BRAZIL com incentivo da Meta e parceria da Redes da Maré e da Secretaria Especial da Juventude Carioca da Prefeitura do Rio de Janeiro (JUVRio), a Mostra promoveu uma série de experiências dentro do mundo do metaverso. Foram exibidos cinco títulos sensoriais de cineastas brasileiros dentro de óculos de realidade virtual (“Fazedoras da floresta”, “O chamado do mar”, “Onde brincam as crianças da Maré”, “Água de beber”  e “Amazônia viva”). Além dos filmes, a mostra contou com atividades presenciais como oficinas, workshops, bate-papos, palestras, atrações musicais, como Oz Crias, a DJ Joyce Tigre, o DJ Miguel Arcanjo e Joca,  e até imersões em um baile no metaverso com alunos DJs dentro das telas. A iniciativa também contou com o apoio de mídia da Globo e da produtora de conteúdo audiovisual F for Felix.

 

Foto: Douglas Lopes

 

 

Um dos pontos-chave que os bate-papos trouxeram foi o questionamento de como a tecnologia tem sua universalização garantida e, na prática, como o metaverso atua na política de acesso. A pesquisa “The Metaverse at Work”, realizada pela Nokia em parceria com a consultoria Ernst & Young com 860 líderes empresariais do Brasil, Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Japão e Coreia do Sul, aponta que o Brasil é o terceiro lugar na liderança quando se trata da implementação da tecnologia do metaverso para aplicação industrial e corporativa - Estados Unidos em primeiro lugar com 65%, Reino Unido (64%) e Brasil (63%). Segundo o Google, até 2025 haverá uma demanda de mais de 530 mil profissionais de tecnologia. “Trazer o Metaverso para a Maré entendo como um movimento político de possibilitar que moradores de favela tenham acesso a tudo o que tem sido feito por vocês nessa área. A Redes da Maré acredita que favela é cidade e também tem que usufruir do que temos de cultura e de melhor”, reflete a diretora da Redes da Maré, Andreia Martins.

Partindo do fato de que a tecnologia está inserida em todas diversas funções no dia a dia, há ainda um grande obstáculo no âmbito dos investimentos nesta área no Brasil, sobretudo em áreas mais periféricas, onde, muitas vezes, os direitos básicos não chegam a ser totalmente garantidos, como saneamento básico, segurança pública, saúde e educação de qualidade, entre outros fatores. Esse foi o desafio principal citado nas discussões porque, para ampliar processos participativos, construir aplicações e recursos junto com a realidade dos moradores e realizar iniciativas como forma de antecipar o futuro, por meio da tecnologia, há altos custos envolvidos, dificultando, assim, a inclusão de ações de tecnologia.

“Vivemos em um país desigual e precisamos partir desse ponto. A rede de ensino pública é a que mais forma pessoas, mas ao entrar nas escolas, há outras desigualdades e problemas estruturais lá dentro que são mais importantes. Mas o que é básico e tem prioridade precisa ser resolvido porque é direito constitucional. O desenvolvimento e o acesso à rede 5G e ao Metaverso, por exemplo, tem que vir junto porque não podemos perder essa corrida do desenvolvimento tecnológico. Sabemos que a maioria dos aplicativos não são criados na América do Sul, então, como entramos nessa competitividade?”, reforça o idealizador e diretor de projetos culturais da Araucária Agência Cultural, Miguel Colker.

 

 Quando surge uma possibilidade, basta dar oportunidades

 

Foto: Douglas Lopes

 

 

Apesar do cenário controverso, um dos grandes destaques do MC.Metaverso foi a motivação e atenção das crianças e jovens nos diversos tipos de atividades durante os três dias. Uma das características dessa nova geração é que grande parte já nasceu com as tecnologias diárias e as informações circulam rapidamente entre eles, incentivando muitos a terem vontade de estudar e atuar profissionalmente na área. “Eu sempre me interessei por tecnologia. Quando criança me interessava muito por jogos eletrônicos e tinha curiosidade de saber como eram feitos, por isso eu quero seguir carreira de programador. O MC.Metaverso me mostrou que a tecnologia é muito ampla e existem muitas possibilidades”, afirma o futuro programador Richard Miranda, 18, e atualmente aluno dos cursos de Formação Profissional em Informática, Manutenção de Smartphones e Tablet, Programação Front-End e do Curso Pré-Vestibular (CPV) da Redes da Maré. Richard já viu pessoas realizando atividades relacionadas ao metaverso, mas foi no evento que ele teve a primeira experiência própria, como assistir aos filmes pelos óculos de realidade virtual.

 

“Quem são as pessoas que estão fazendo as tecnologias, os filmes? Trazer acesso ao conhecimento de tecnologias para que esses jovens possam acessar esse mundo, democratizar esse acesso para que possamos disputar os espaços nessas narrativas. As favelas do Rio abarcam as potências do Brasil.” - Andressa Núbia, curadora de novas tecnologias na agência GatoMÍDIA, do Complexo do Alemão

 

No bate-papo “Futuro: O metaverso como política de acesso”, (da direita para a esquerda) a pesquisadora e desenvolvedora de conteúdos em Cinematic VR Inês Maciel mediou o painel com os convidados criador do Festival Hacktudo, Miguel Colker, a diretora criativa imersiva Andressa Núbia e a coordenadora na Fundación Ciudadania Inteligente, Maria Luiza Freire. Foto: Douglas Lopes

 

Entre as atividades de mão na massa, Rayane Gomes teve a oportunidade de participar da oficina Meta Spark Descomplicado: Criando seu primeiro filtro para o Instagram e do Workshop Espaços do Metaverso: criando gratuitamente seu primeiro espaço virtual“Desses dois projetos eu gostei bastante da criação do espaço virtual (ganhei o drone nesse). Nos explicaram de maneira simples e bastante elaborada como criar na plataforma um espaço virtual. Como eu tive mais interação na prática, eu pude me inspirar e despertar meu lado criativo. E como eu descobri que no metaverso também há como você se reunir com pessoas interessadas na área, dá para fazer muitas colaborações. O evento também me proporcionou conhecer outras pessoas da área de tecnologia.”

 

Sobre a educação tecnológica viabilizada pela Redes da Maré

Desde 2014, a Redes da Maré tem construído e realizado formações, cursos livres e oficinas envolvendo diversas tecnologias, e diferentes níveis dessas formações, como os projetos Nas Ondas da Maré - que oferece os cursos de Formação Profissional em Informática, Manutenção de Smartphones e Tablets, Programação Web e Desenvolvimento em Front-End e o mais recente: Programação Back-End -, de Robótica, o Peritech Maré com os alunos do Colégio Estadual Professor João Borges de Moraes, o Conectando e o Formação Digital.

O educador popular de tecnologia no curso Formação Profissional em Informática, Rafael Ramires, 26, é pesquisador em exclusão e inclusão digital e tecnológica em favelas e periferias e reflete sobre esse fenômeno. "Quando você tem uma sociedade hiperdigitalizada, onde boa parte da população na cidade tem acesso à internet e aos mais variados dispositivos, mas dentro das favelas, as pessoas sequer possuem luz em casa, você começa a perceber que a tecnologia não é acessível. Ter acesso à internet, não garante que você vai saber usar a internet ao seu favor. A esse fenômeno, do acesso mas sem os conhecimentos certos pra tu aproveitar ao máximo, chamamos de exclusão digital ou tecnológica. Assim, a educação tecnológica da Maré, feita pela Redes, tem se preocupado em realizar um esforço para construir bases fortes e resilientes nas suas turmas. Falar sobre Desinformação, Fake News, Inteligência Artificial e outras tecnologias que impactam a sociedade, fazem parte da rotina das aulas por aqui. O metaverso não escapa disso, e tem sido uma ferramenta ponte, para apresentar um mundo de possibilidades pra favela fazer o que faz de melhor, existir e resignificar sua realidade, já que o metaverso propõe impulsionar a realidade para novos rumos, a Maré tem feito isso muito bem.

 

 

Foto: Douglas Lopes

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