No Brasil, houve uma grupo que trabalhou arduamente para que a população negra pudesse ascender socialmente. Estes senhores e senhoras, lá no tempo de nossos bisavós, estavam preocupados com o que viria depois da Abolição. Como iríamos ingressar no mercado de trabalho e qual a melhor maneira de contribuirmos para o crescimento do país?
Fizeram escolas onde não havia, cursos profissionalizantes, organizavam documentos e abriram pequenos jornais para divulgar suas ideias. Até ensinavam como se comportar: falavam da importância de manter sempre os cabelos penteados, os sapatos engraxados. Fizeram a sua parte. Alguns mais confiantes chegaram a afirmar que se negros e negras estudassem, seriam respeitados, nunca mais seriam humilhados.
Estes valores foram repetidos por todos a nossa volta. Seja na escola ou em casa, bastaria fazer nossa parte e o respeito, a cidadania plena, seriam alcançados. Afinal, são estes o prêmio do cidadão, assegurado pela justiça e pelas regras do jogo, numa sociedade regida pelo capital e trabalho.
O episódio ocorrido com Matheus Ribeiro, ou seja, a ideia de suspeição diante de um crime ocorrido nas redondezas é um dos tantos Racismos Cotidianos que atravessam os portais do tempo para nos lembrar das estruturas que precisam mudar.
Mas o que será mais simples: ensinar àquelas pessoas que os negros e negras não podem ser revistados, ter seus bens inspecionados toda vez que eles se sentirem lesados/ameaçados ou lembrar ao Estado Brasileiro que fizemos a nossa parte e que ele tem que nos defender? Fazer valer as máximas que o legitimam?
As pessoas que escrevem sobre estes assuntos diriam que o acontecido com Matheus Ribeiro é Racismo Estrutural; que aquele casal fez valer os valores da Branquitude, que desde sempre age assim; que Matheus é um corpo marcado por uma política que o lê como ameaça, um alvo, como um suspeito.
A questão que a Redes da Maré, por meio da Casa Preta da Maré, traz se refere aos ensinamentos que serão transmitidos a nossos filhos: não vale trabalhar, não vale acordar cedo, matar um leão por dia, aceitar o jogo democrático?
Mais uma vez, as regras fundamentais estão sendo quebradas.
Estamos envergonhados diante dos senhores e senhoras que achavam que bastaria fazer nossa parte para que fôssemos respeitados!
Foto © Douglas Lopes
Casa Preta da Maré
Rio de Janeiro, 17 de maio de 2021
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